Especialistas desaconselham pressa em fazer correção estética, popular nos EUA e Inglaterra
Levantar os seios, definir o abdome e se livrar das gordurinhas: um pacote completo que virou moda entre mulheres que acabam de dar à luz e pretendem voltar a ter o mesmo corpo que exibiam antes da gestação. Populares nos Estados Unidos e na Inglaterra, onde são vendidas em pacotes com nomes atraentes como “mommy makeover” ou “mommy job”, o conjunto de cirurgias para apagar as marcas deixadas pela gravidez já é bastante difundido nos consultórios brasileiros. No entanto, despertam alertas sobre a pressa das mulheres e a insistência em modificar o corpo sem antes esperar que ele volte ao normal naturalmente.
“Algumas mulheres nos procuram durante a gestação para saber se podem fazer plástica logo após a cesárea”, afirma a cirurgiã plástica Luciana Pepino. “Há médicos que fazem, mas não é recomendado. E o difícil é convencê-las a esperar”, explica, acrescentando que muitas até mesmo se iludem com o poder das cirurgias, achando que vão fazê-las perder peso, o que não é verdade.
O cirurgião plástico Cláudio Valle, do corpo clínico do Hospital São Rafael, também atende pacientes com esse perfil: “Tem pessoas que, ainda amamentando, querem fazer lipoaspiração”, conta. “Em geral são mulheres muito bonitas, que não aceitam a mudança no corpo provocada pela gravidez”, diz.
Segundo Valle, elas não conseguem se ver com estrias e a pele flácida decorrente da gestação. Além disso, outro fator que impulsiona o imaginário dessas recém-mamães é o visual de muitas celebridades que, dias após o parto, desfilam com corpos perfeitos. Algumas, como a atriz Giovana Antonelli, assumem ter recorrido à lipoaspiração. Outras, como a apresentadora Angélica, dizem nunca ter feito, mas alimentam especulações sobre como voltaram à antiga forma em tão pouco tempo.
No ano passado, a Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos fez mais de 325 mil cirurgias plásticas em mães com idades entre 20 e 39 anos. No Brasil, não há dados compilados, mas os médicos afirmam que a procura só aumenta.
“Amamentei minha filha por cinco semanas e meus seios diminuíram”, conta a inglesa Orlaith McAllister, de 28 anos. “Passei por todo esse sofrimento e o que desejava era voltar a apreciar meu corpo”, explica ela, para justificar a cirurgia que fez quando a filha completou 10 meses.
O cirurgião americano David Stoker foi um dos primeiros a comercializar essa renovação estética das mamães, oferecendo um pacote que inclui cirurgia para levantar os seios - com ou sem implantes -, plástica do abdome e lipoaspiração. As mulheres, segundo o médico, não precisam mais se sentir “complexadas ou melindradas com sua aparência”.
CUIDADOS
Obstetras e cirurgiões plásticos são unânimes em dizer que, quando bem feitas, e no tempo adequado, as cirurgias não apresentam problemas e melhoram a auto-estima das mulheres. Porém, é necessário bom senso. “Você não pode operar uma mulher que acabou de dar à luz ou que está amamentando. E você não pode achar que todas as mulheres são iguais, reagem da mesma maneira e têm o mesmo corpo”, afirma o ginecologista e obstetra Soubhi Kahhale, professor da Universidade São Paulo (USP) e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Ele enumera os motivos. O primeiro deles é a predisposição a problemas de coagulação do sangue, provocados pelas alterações hormonais naturais da gravidez. Desse modo, toda mulher nos meses depois da gestação tem maiores chances de ter embolias e tromboses. Outro problema diz respeito ao próprio corpo, que precisa de um período para voltar ao normal. O útero, que está dilatado, vai se contrair. A pele ainda vai diminuir. As mamas estão cheias de leite e os hormônios, ainda em níveis diferentes do normal. “É impossível ao cirurgião fazer uma programação da cirurgia.”
Assim, é preciso esperar pelo menos seis meses após parar de amamentar para fazer as cirurgias. No caso de mulheres que ganharam muito peso, é necessário emagrecer antes de recorrer às correções no abdome e à lipoaspiração. “É um processo individualizado e cada paciente tem uma necessidade”, afirma Antonio Graziosi, presidente do departamento de cirurgia plástica da Associação Paulista de Medicina (APM). “Qualquer coisa fora disso, em pacotes, é mercantilização, é banalização da medicina”, afirma.
A advogada Ana Rita Cardoso Meireles, de 30 anos, esperou três anos para recorrer ao bisturi. Além da questão financeira, ela preferiu esperar para ver se não queria outros filhos. “Agora era o momento, apesar de estar incomodada com a minha barriga desde o fim da gestação”, conta ela.
Há pouco mais de duas semanas, Ana Rita colocou prótese nas mamas, fez uma cirurgia de abdome e uma lipo. “Cada mulher reage de um jeito. No meu caso, fiquei com barriga de avental, que me deixava muito incomodada”, diz ela, que ainda está no período pós-operatório. “Quando tirei a cinta, já percebi a diferença. Não vejo a hora de ver o resultado.”
CRÍTICAS
Os críticos das cirurgias vêem ainda uma banalização não só da saúde, mas do corpo da mulher. Diana Zuckerman, do Centro Nacional de Pesquisa de Mulheres e Famílias, nos Estados Unidos, afirma que, se o marketing conseguir tornar o corpo depois do parto “algo inaceitável socialmente, imagine o quão enorme será o seu público e quantas cirurgias poderão ser comercializadas”. Em resumo: “o sonho dos homens de marketing é fazer as mulheres acreditarem que seus corpos ficam repugnantes após o nascimento de um filho”, afirma Diana.
COM THE GUARDIAN
FRASES
Diana Zuckerman
Pesquisadora americana
“Se o marketing conseguir tornar o corpo depois do parto inaceitável socialmente, imagine quantas cirurgias poderão ser comercializadas”
Cláudio Valle
Cirurgião-plástico
“Em geral, são mulheres muito bonitas, que não aceitam a mudança no corpo”
Fonte: O Estado de São Paulo
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